Ontem terminei de ler Fervor de Buenos Aires, livro de poemas escrito por Borges em 1923 e o início da minha jornada em busca da compreensão borgeana. Nas Obras Completas, o escritor rememora no prólogo, que data de 1969, como foi escrever o livro e quais seus sentimentos a respeito dos poemas que escrevera há tanto tempo – e que descreviam o reencontro de uma Buenas Aires fantasmagórica, linda e melancólica. “Naquele tempo, procurava os entardeceres, os arrabaldes e a desdita; agora, as manhãs, o centro e a serenidade”. Para Borges, Fervor de Buenos Aires “prefigura tudo o que faria depois”. Tentou cantar uma Buenos Aires perdida, “de casas baixas e, para o poente ou para o sul, de chácaras gradeadas”
Borges me fez gostar de poesia. De uma maneira tão intensa que não consigo mais imaginar como antes não me sentia emocionada por versos. Talvez tenha me apaixonado apenas pela poesia de Borges, e não pela poesia em geral – mas essa dúvida fica para depois. O que importa é que Borges, nestes poemas simples e sucintos, tenta reconhecer em Buenos Aires a cidade amada que deixara para trás. Em La Recoleta, rememora em um cemitério as lembranças dos antepassados e das estátuas de mármore que se erguem imponentes e solitárias, em um local que simboliza uma morte que não se apaga; em O Truco, por meio da metáfora das cartas, traz uma Buenos Aires que mantém características fugazes de seus dias antigos; em Rosas, como diz nas notas do final do livro, mostra sua “selvageria unitária” ao relembrar o nome maldito de um déspota, cujos crimes nunca serão passíveis de remissão; em Caminhada se entristece por ser, aparentemente, o único espectador de uma beleza das ruas que hoje está perdida; em As Ruas, declara sua simbiose e sua paixão pelas “ruas entediadas do bairro, quase invisíveis de tão habituais, enternecidas de penumbra de de ocaso” e em A Volta, narra a tristeza de saber que as memórias há muito deixadas de lado só podem ser resgatadas pelo hábito, e lamenta quanto tempo terá que esperar para que novamente possa ver Buenos Aires como seu lar.
Um livro de memória. De tentativas – melancólicas – de rememoração. E um sentimento de morte ao ver tudo aquilo que amou desaparecer com vagar, mas talvez para sempre.
Agora, é a vez de Lua Defronte, de 1925. Agradeço às pessoas que, por conhecerem bem Buenos Aires, estão tentando me descrever o porque do amor de Borges pela cidade, suas ruas e suas praças.
Escreve muito bem. Parabéns pelo texto.
Beijo!
\o7